sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Vale dos Vinhedos repudia decisão da Câmara

Aprovale considera grave ameaça lei que permite loteamento em antiga área rural

Bento Gonçalves, 28 de agosto de 2009 - O projeto de Lei Complementar votado nesta segunda-feira pela Câmara de Vereadores de Bento Gonçalves ameaça iniciar a descaracterização territorial do Vale dos Vinhedos. Este é o entendimento da Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale), que repudia a manobra realizada pelo legislativo municipal. Votada em caráter de urgência, a lei foi aprovada pelos vereadores apesar das diversas manifestações da comunidade local, contrárias a lotear a área de um dos mais antigos lotes do Vale.

Segundo os associados, o espaço rural que foi transformado em área urbana possui grande importância histórica, social, cultural e ambiental. A sua ocupação, na forma como foi aprovado o projeto de Lei Complemetar nº 008/2008, traria grandes prejuízos ao principal roteiro turístico do município e ameaçaria o primeiro destino de enoturismo no Brasil.

Ontem, quinta-feira, o prefeito Roberto Lunelli reuniu-se com a Aprovale e se declarou surpreendido com o desengavetamento do projeto de lei, feito pelo próprio líder do governo na Câmara. “Infelizmente houve a votação antes que se pudessem apresentar novos pareceres ao Projeto”, sinalizando aos empresários e vinicultores do Vale que poderá vetá-lo, embora tema que a Câmara derrube sua decisão. Recomendou à entidade e à comunidade tentar sensibilizar o Presidente da Câmara, Valdecir Rubbo (PDT).

O prefeito atendeu a chamado da secretária Municipal de Turismo, Ivane Fávero, que expôs a preocupação do grupo sobre os impactos negativos do loteamento no Vale, especialmente por serem dezenas de lotes de apenas 200 m2 . Lembrou ainda do planejamento estratégico que está sendo construído para promover o desenvolvimento sustentável de Bento Gonçalves, no qual o turismo é um dos principais pilares sócio-econômicos . Considerado atrativo-âncora da região, o Vale dos Vinhedos recebe hoje mais de 150 mil visitantes por ano à procura de suas paisagens únicas no país.

O Promotor de Justiça Elcio Resmini Meneses também se reuniu com a Aprovale ontem à tarde. Assim como os representantes do executivo, Meneses declarou-se favorável à preservação do Distrito e de suas características ambientais e paisagísticas. “Infelizmente (nesse caso), os interesses econômicos sobrepujam-se aos argumentos históricos, ambientais e sociais”, declarou o promotor.

Na sequência, o presidente da Aprovale - Aldemir Dadalt - e um grupo de associados foram recebidos pelo Presidente da Câmara, Valdecir Rubbo (PDT) para entregar-lhe um ofício de repúdio ao projeto de lei. O documento também será entregue ao Ministério Público, ao Prefeito Lunelli e a todos os Vereadores que aprovaram o projeto . ‘Não descansaremos enquanto não formos ouvidos para esclarecer o quanto este loteamento é prejudicial. Este tipo de atividade ameaça não apenas o futuro do Vale como destino de enoturismo, mas todas as três cidades do qual ele faz parte, Bento Gonçalves, Monte Belo do Sul e Garibaldi.”

A Aprovale é composta por 31 vinícolas e outros 39 empreendimentos ligados ao turismo e localizados no Vale dos Vinhedos.

ENTENDA O CASO:

Em 2008, a câmara municipal de Bento Gonçalves votou a transformação da área em questão em zona urbana, porém, sem regime urbanístico. Ou seja, não foi definido o índice de ocupação que haveria nesta área.

No final de dezembro do mesmo ano, houve sessão aberta à comunidade para que fossem ouvidas suas manifestações sobre o tema. Na ocasião, a Aprovale oficializou sua posição contrária ao projeto de lei e solicitou a requisição de pareceres do Conselho Distrital do Vale dos Vinhedos, do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (Ipurb), da Secretaria do Meio Ambiente e da Fundação Estadual de Proteção Ambiental, avaliando a área em questão, assim como do Ministério Público quanto à extensão da área urbana em região hoje protegida por regime especial.

Na sequência, todo o projeto de lei foi arquivado e os pareceres nunca chegaram a ser elaborados.

Na última segunda-feira, oito meses depois do arquivamento, o projeto foi trazido para a pauta pelo vereador Airton Minúsculi (PT) com votação em regime de urgência.

Durante a sessão, o vereador Mário Gabardo (PMDB) pediu vistas ao projeto na tentativa de que ele saísse da pauta, também solicitou que não fosse votado no regime proposto, tendo assim que passar por três votações ao invés de uma única. Pela primeira vez no ano, o pedido de vistas foi negado.

A argumentação de Minúsculi ignorou as manifestações contrárias ao projeto realizadas em 2008 pela Aprovale representando a comunidade do Vale dos Vinhedos. Tampouco foram realizados os pareceres requisitados pela entidade antes da validação do projeto pela Câmara.

Segue abaixo o ofício com o pedido de veto encaminhado ao executivo municipal com a argumentação que embasa a reivindicação da entidade.

Ofício

Prezado Senhor,

A Aprovale - Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos, representando as 31 vinícolas e os 39 empreendimentos turísticos instalados no Vale dos Vinhedos, repudia o resultado da votação do Projeto de Lei Complementar nº 008/2008, votado pela Câmara Municipal de Vereadores em caráter de urgência na última segunda-feira, dia 23 de agosto de 2009.

O espaço territorial transformado em área urbana tem grande relevo histórico, social, cultural e ambiental. A sua ocupação, na forma como foi aprovado o projeto, trará grandes prejuízos ao principal roteiro turístico do município e à maior referencia em destino de enoturismo no Brasil. Sendo assim, a área precisa ser protegida e preservada em todo o seu contexto, o que inclui a manutenção de suas características agrícolas, com preservação dos parreirais, das construções históricas, das tradições locais dentre outros aspectos.

A entidade propõe que a área considerada de expansão urbana que se sobrepõe aos limites do Distrito, volte à sua condição de área rural.

Fundamentam a proposta os seguintes argumentos:

- O perímetro do Vale dos Vinhedos está estabelecido pela Lei Municipal nº 2.360, de 11 de agosto de 1994, que cria o Distrito Vale dos Vinhedos. Em seu artigo 5º a Lei estabelece os limites e confrontações. Esta lei ainda está em vigor e os limites seguem as linhas de divisa das colônias originais;

- Alterar o perímetro do Distrito implicaria em alterar a área da primeira região brasileira demarcada como Indicação de Procedência (IP), passo inicial para a futura instituição da Denominação de Origem (DO), importante reconhecimento e distinção ao legado e trabalho da comunidade local, voltada à produção de vinhos. Este processo está em estágio avançado, sendo para breve sua formalização, que representará um avanço significativo do nosso produto frente ao mercado internacional;

- O Vale dos Vinhedos tem buscado, numa trajetória de anos, a preservação de suas paisagens, tendo inclusive sido classificado dentro do Plano Diretor original, em seu macrozoneamento, como Zona de Proteção da Paisagem do Vale dos Vinhedos (ZPPVV), numa iniciativa inédita de preservar seu equilíbrio. Este Zoneamento considera os aspectos geográficos, históricos, arquitetônico, antropológico e mesmo sociológico, onde a paisagem se insere num contexto de processos ambientais, sociais e culturais;

- O esforço local em proteger seus domínios fez do Vale dos Vinhedos uma região turística reconhecida e um destino turístico respeitado em todo o Brasil e fora dele. Esta imagem alcançada pelo Distrito eleva e contribui para a imagem do Município de Bento Gonçalves, hoje denominada Capital Brasileira do Vinho

- Observando o mapa do Plano Diretor se percebe que tal proposta de expansão destroi áreas de preservação permanente, pois incide sobre mata nativa, parreirais e ainda atinge parcialmente as margens do Rio Pedrinho;

- Outro aspecto a ser observado é que esta urbanização passará a permitir ocupações indesejadas à região, gerando ainda um fluxo totalmente avesso às atividades e vocação do Vale dos Vinhedos, cada vez mais voltada ao enoturismo.
Considerando o acima exposto, a Aprovale sugere que respalde vosso veto embasado nos seguintes pareceres:

- Parecer do Conselho Distrital do Vale dos Vinhedos, conselho este instituído para dar suporte legítimo junto à comunidade a todas as intervenções de caráter de ocupação do solo;

- Parecer técnico do Ipurb quanto à ampliação da área urbana sobre os limites demarcados do Distrito do Vale dos Vinhedos, que se destacou como a primeira região rural brasileira com reguladores de crescimento;

- Parecer técnico da Secretaria do Meio Ambiente e da Fundação Estadual de Proteção Ambiental, avaliando a área em questão

- Parecer do Ministério Público, quanto à extensão da área urbana em região hoje protegida por regime especial.

Por isso, a Aprovale, em nome de seus 70 associados, pede a Vossa Excelência o veto ao projeto de lei votado na Câmara Municipal que trará grandes prejuízos não apenas ao Vale dos Vinhedos, mas a todo o município, uma vez que segue na contramão do projeto turístico planejado para Bento Gonçalves.

Bento Gonçalves, 27 de agosto de 2009

Aldemir Dadalt
Presidente da Aprovale


Exmo. Sr.
Roberto Lunelli
M.D. Prefeito Municipal de Bento Gonçalves


Fonte: Conceito Comunicação

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